Lei Caó na perspectiva da interseccionalidade

O Estado Brasileiro tem como base institucional o tratamento igualitário, porém em todas as relações e estruturas da sociedade, o racismo está presente. Desde sua origem no século XV, por questão de raça, teve seu ponto alto no período das ocupações portuguesas na América. 

O livro “Ensaio sobre a desigualdade das raças humanas” de Joseph Arthur de Gobineau, considerado como a base para a concepção de divisão racial, declara que “uma raça originalmente pura ao misturar-se com outras se tornava degenerada, perdia as suas qualidades essenciais, levando essa civilização ao declínio”.

Diante disso, é notável expor a tese do branqueamento racial no Brasil que buscava eliminar principalmente, a cultura do negro, separando as raças, assim ocorrendo a miscigenação que embranqueceria a população. Observa-se, portanto, que a Discriminação Racial está presente desde os primórdios da história do Brasil. É contra essa inferiorização racial, que mantém os brancos em um padrão superior subjugando os negros, que a busca pelo estabelecimento de lutas de classe e manutenção de privilégios se tornou vital para o país nas últimas décadas.

Para contornar a discriminação e a injúria racial, Carlos Alberto Caó de Oliveira, jornalista, advogado e ex-deputado, através de suas contribuições à Constituinte de 1987 e 1988, criminalizou os preconceitos de raça, cor, sexo e estado civil, e transformou o racismo em crime inafiançável e imprescritível.

Carlos Alberto Caó Oliveira é jornalista e militante do movimento negro | Foto: Reprodução/Canal Brasil/ Programa Espelho

Deputado constituinte pelo PDT, ele foi responsável pela Lei Caó que “define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor”. Com o feito, o racismo passou a ser crime com pena de reclusão de até cinco anos, sendo essas as penas válidas também, por exemplo, por recusa a atendimento ou acesso de qualquer pessoa por “discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. A legislação ainda prevê como crimes, o que está ainda mais marcante no período eleitoral que vivemos por meio de veículos de comunicação, “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito”.

Torna-se eminente, então, trazer à tona o conceito de Interseccionalidade. De forma sucinta, trata-se de “levar em conta as múltiplas fontes da identidade”, embora não procura “propor uma nova teoria globalizante da identidade” (HIRATA, Helena). A interseccionalidade remete a uma teoria de múltiplos vieses que busca compreender as identidades e as desigualdades sociais por intermédio de perspectivas, indo além da multiplicidade dos sistemas à volta, que oprimem e denotam as desigualdades.

A interseccionalidade e o racismo estão intrinsecamente relacionados à Lei Caó pelo fato de o autor Carlos Alberto Caó não só buscar a penalização de injúrias raciais, mas também por compreender onde se dão os diferentes tipos de preconceito, para contorná-los e evitá-los. Seja discriminação por sexo ou raça, o texto da lei propõe pena para ambos, ao delimitar como crimes “atos resultantes de preconceito de raça, de cor, de sexo ou de estado civil”.

O racismo não pode ser visto de forma insensata, sem constituir uma linha do homem, branco e negro, da mulher, branca e negra, não olhando apenas para as diferenças de sexo, mas mobilizando raça e gênero. Dessa forma, é possível demonstrar as desigualdades entre diferentes grupos sociais, possibilitando um norte das razões da urgência da Lei Caó. Conclui-se, portanto, que o papel da interseccionalidade é de inquestionável importância, no que tange a analisar, compreender e buscar diferentes pontos de vista para entender as inúmeras diferenças sociais.

Autor: Hayom Tovi C. Silva

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