Homens, curvem-se: sexo oral não é favor


O #PapoFeminsta é aquele cantinho especial onde xs Intermidiáticxs gritam “O QUE DISSE MACHISTA?”. É aqui que a gente usa tudo que estudamos sobre Teoria Feminista pra analisar e problematizar filmes, séries, políticas públicas, canais de comunicação e várias outras construções surgidas nessa sociedade patriarcal que merecem ser repensadas.

Não é difícil perceber o quanto os valores hegemônicos se fortalecem ao moldar e reprimir nosso discurso e nossa sexualidade. Na idade média, por exemplo, muitas mulheres foram mortas e perseguidas por gozarem  (pasmem!) já que o orgasmo feminino era considerado uma perversão e um crime contra a moral e os costumes da época. O desejo sexual feminino era considerado tão repugnante que, por muito tempo, uma das marcas que evidenciavam que a mulher era uma bruxa era o clitóris grande, como se o clitóris fosse um sinal do demônio no corpo de algumas mulheres que, por razões muito óbvias e pouco sensatas, eram queimadas, mutiladas, perseguidas e torturadas.
No discurso, a repressão fica ainda mais óbvia quando conhecemos popularmente o nome da perversão e desconhecemos o nome do maior responsável pelo gozo feminino. Quem sabe, por exemplo, o nome dado a pessoa que apresenta um nível anormal de desejos e fantasias sexuais? Acertou quem disse ninfomaníaca. O que quase ninguém sabe é que este é um substantivo exclusivamente feminino e que os homens, num diagnóstico clínico, apresentam Sartiríase e não Ninfomania.  
Por outro lado, é muito mais fácil encontrar alguém que saiba - ou ache que saiba - o nome dado a prática de estimular a região íntima com a boca, popularmente chamado de boquete. Poucos sabem que o nome, por definição, deve ser usado somente quando esse estímulo ocorre no pênis, mas quando é na vagina.. ninguém lembra que minete (ou cunilíngua) existe.
Mas, felizmente, pra toda norma existe um transgressor, um perverso, um anormal ou, como prefiro chamar, um queer que nada contra a corrente hegemônica e joga as verdades na roda. E pra alegria de todas as bruxas mulheres, Karol Conka lançou em 2017 o videoclipe Lalá que é, basicamente, uma mistura de desabafo com tutorial para os homens com baixo desempenho na hora do minete.
Ao expor sua frustração a rapper curitibana, além de mostrar o quão frágil é a masculinidade, quebra vários tabus ligados a prática de sexo oral nas mulheres. A letra é extremamente didáticas, só não aprende quem não quer:



“O clima deixa de ser quente, confundiu minha mente/ Falam de mais, quando chega na hora a ação não é equivalente/ Nem vem, sou apenas mais uma com experiência e sabe quem tem/ Vejo vários convencidos achando que no final mandou bem/ Minhas amigas concordam também/ Vocês podem ir mais além/ Sem dedicação espantam um harém/ Curvem-se, encostem os lábios na flor/ Quebra esse tabu, isso não é nenhum favor”

O clipe consegue ser poeticamente explícito ao retratar a vagina com flores e frutas, além de homens em posição de submissão durante a relação sexual. Empoderadíssima, Karol Conka também fez questão de produzir o vídeo baseando-se apenas em opiniões femininas: “Tive a ideia de fazer um clipe com uma equipe toda formada por mulheres de forte posicionamento. Tivemos ideias coletivas que mostram o universo feminino de uma maneira doce e ao mesmo tempo divertida. A intenção é passar a mensagem quebrando o tabu de maneira informativa e criativa!”


O trabalho da artista Stephanie Sarley foi uma das inspirações para o clipe.

Muito feminista e com uma pegada queer por ousar retratar com normalidade um prazer tão “perverso  quanto o das mulheres, a obra expõe o atraso do discurso hegemônico que, até hoje, demoniza e enclausura a sexualidade e a liberdade feminina. A obra de Karol foi alvo de críticas da comunidade LGBT uma vez que apenas retratou homens em seu trabalho, ignorando o fato de que mulheres também fazem pouco caso na hora de fazer sexo oral umas nas outras. Apesar de toda a polêmica, devemos sempre nos questionar: uma única música precisa dar conta de tudo?
O trabalho põe em voga um tema que, por muito tempo, foi visto com maus olhos pela sociedade. Ao sinalizar o clipe como impróprio para menores de 18 anos, os moderadores do Youtube (muito provavelmente homens que não sabem fazer o lalá) apenas reforçam a importância de iniciativas como essas. A perseguição ainda existe e acontece diariamente. Mas ao invés de queimar e mutilar, a perseguição vem em forma de censura e silêncio.

Vitória Bordon

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